sexta-feira, 20 de março de 2009

Os bárbaros civilizados

Ficou registado na História que Alexandre o Grande admoestou um pirata que respondeu que por usar somente um pequeno barco era chamado de bandido (hoje seria um terrorista) enquanto Alexandre comandava uma frota e por isso era chamado de imperador (e portador de civilização)
Este episódio também me recorda a frase de La Fontaine que diz que:
“Aqueles que exercem o poder arranjam sempre maneira de dar à sua tirania a aparência de justiça.”
Isto vem a propósito duma reflexão que podemos fazer da situação que internacionalmente vivemos.
Uma guerra de agressão é pela sua própria natureza um mal muito maior do que qualquer outra violência que conheçamos, como observou aliás, o Tribunal de Nuremberga. Segue-se daí que a matança de civis na guerra é, de uma perspectiva moral, mais bárbara do que qualquer violência sem sentido e irresponsável daqueles que estão a combater a subjugação e a ocupação que por vezes possam cometer.
Já Noam Chomsky teve oportunidade de dizer que se as leis de Nuremberga fossem aplicadas, todos os presidentes norte americanos do pós guerra teriam sido enforcados e também, podemos nós acrescentar, o actual primeiro-ministro inglês.
Por que é que a maior parte das pessoas não está consciente disto? Por que é que os feitos bárbaros daqueles que apregoam serem civilizados não fazem parte da consciência popular? A principal razão é a realidade do poder global. Aqueles que se cobrem com o manto da civilização são os senhores do mundo neste momento crítico da história. Eles estão em posição de moldar o discurso global sobre o que é certo e o que é errado, quem é bom e quem é mau. O seu poder é tão esmagador que transformar o opressor em libertador, o agressor em vítima, o belicista em pacifista.
É bárbaro assassinar 52 civis em Londres, mas será civilizado matar 100 mil civis no Iraque? Pois este é o número de civis que morreram ali desde Março de 2003, devido à ocupação anglo-americana segundo dados de vários organismos internacionais.
Mas apesar de todos considerarem bárbaro o acto terrorista ocorrido Londres, alguns de nós ficariam profundamente perturbados por declarações atribuídas a responsáveis britânicos e americanos no rescaldo imediato da tragédia que procuravam apresentar-se a si próprios como homens que defendiam os cânones da conduta civilizada. Na visão deles — e do ponto de vista dos media — eram "defensores da civilização" sob o assédio de elementos bárbaros.
Será civilizado usar munições de fragmentação, bombas incendiárias, urânio empobrecido e armas químicas contra uma população civil? A destruição total da cidade de Faluja é testemunho disto. É uma cidade onde até mesmo crianças, mulheres grávidas, pessoas idosas e civis feridos foram alvejados por balas.
E podemos nós esquecer a cruel e degradante tortura de prisioneiros em várias partes do Iraque? Será isto um marco de civilização? Será que pessoas civilizadas profanam a herança cultural e arqueológica de uma das mais antigas civilizações sobre a Terra? Será a maciça devastação ambiental e ecológica do Iraque provocada pela ocupação, um acto de civilização?
Este totalitarismo em que vivemos é muito diferente do totalitarismo clássico do século XX. Os totalitarismos clássicos do século XX baseavam-se na ocultação da informação, na proibição da informação e da propaganda da dissidência. Apenas o discurso oficial ou não contraditório com o dito, era tolerado. Assim foi na Itália, na Alemanha, na Espanha, em Portugal, na URSS, nos Países de Leste, na China, etc...
O totalitarismo do século XXI, tem a capacidade de saturar o "espectro informativo", de um modo cada vez mais denso e penetrante, com a propaganda do regime, disfarçada de informação, ou até mesmo disfarçada de crítica, porém relegando para a marginalidade toda a forma de pensamento e todas as iniciativas alternativas ao estabelecido, ao pensamento dominante. Mas não tem necessidade de proibir o fluxo dessa informação alternativa, pois o seu domínio absoluto dos grandes media, fazem com que isso não seja necessário. Até é bastante proveitoso, pois assim tem o argumento da democraticidade da liberdade de expressão
das mais diversas correntes de opinião. Comparativamente é um pouco como se passa nos jornais que possibilitam aos cidadãos repor a verdade nas suas próprias páginas mas relegado para uma página interior, num canto, sem qualquer destaque e com uma letra minúscula de modo a que os leitores sejam uma minoria realmente insignificante…

http://resistir.info/varios/barbarie.html

1 comentário:

zigoto disse...

Aqui está um excelente post que, infelizmente, só chega ao conhecimento de quem tem capacidade para o ler; isto é: quem tem acesso à internet e já conhece este blogue.
De aí o meu apelo a todos os nossos leitores para divulgarem O Cacimbo entre todos os vossos correspondentes.
Concordem, ou não, com o que os autores deste blogue aqui publicam, o vosso comentário é livre e não depende de qualquer censura prévia.
Aproveitem este espaço...enquanto os torquemadas e quejandos não acabarem com a liberdade de expressão de que, por enquanto, O Cacimbo tem a honra de manter.
Mesmo que discordem de nós: não hesitem em publicar os vossos comentários.
Garanto-vos que ninguém vos impedirá de o fazerem.
É claro que talvez surjam outros comentários discordantes das vossas opiniões.
O que só é saudável, democrático e contribui para evitarmos "a verdade única" que nos tentam impor.
Como dizia "ou outro" que todos conhecem: DA DISCUSSÃO NASCE A LUZ.
Sejam bem-vindos com as vossas críticas.O Cacimbo não foi criado para exigir a boca de cena, e se limitar a agradecer os aplausos do público arregimentado com bilhetes oferecidos.
Disse.