Dirigente fala em complexo histórico e paternalismo
Catalunha garante que "Espanha ainda não assumiu independência de Portugal"
O vice-presidente do Governo Autónomo da Catalunha, Josep-Lluís Carod Rovira, disse hoje em Barcelona que Espanha ainda não assumiu que Portugal é um Estado independente. Carod Rovira considera que Madrid pretende manter uma "tutela paternalista" e uma atitude de "imperialismo doméstico" sobre o Estado Português, onde, acrescentou, "historicamente, sempre houve um certo complexo por parte de alguns sectores dirigentes em relação a Espanha".
O número dois do executivo catalão e responsável pelas relações externas da região com 7,5 milhões de habitantes, afirma que pretende conseguir o apoio de Portugal para o projecto de independência que defende para a Região Autónoma, cujo referendo propõe que se realize em 2014. "O que menos interessa a Portugal é uma Espanha unitária", afirmou, sublinhando que "uma Catalunha independente na fachada mediterrânea poderia ser o contrapeso lógico ao centralismo espanhol". Segundo Carod Rovira, Portugal deve perceber que a independência da Catalunha nada tem que ver com a regionalização. "A Catalunha é como Portugal mas sem os Restauradores".
O vice-presidente do Governo da Catalunha recorre à História, designadamente aos acontecimentos de 1640, para afirmar que "se as coisas tivessem sido ao contrário, hoje Portugal seria uma região espanhola e a Catalunha um estado independente". No século XVII, durante o reinado de Filipe III, Madrid foi confrontada com revoltas em Portugal e na Catalunha mas o Império, apoiado pela França, reprimiu as sublevações catalãs e da Biscaia.
Josep-Lluis Carod Rovira, que fala e entende perfeitamente o português, garantiu ter "muitos aliados internacionais" para o que designa "projecto de independência para a Catalunha" mas recusou-se a aprofundar o assunto para não dar "pistas desnecessárias". Para Carod Rovira a situação da Catalunha é específica e não é comparável a nenhuma autonomia ou a qualquer processo de independência. "A Catalunha não é o Kosovo, nem é o País Basco, nem a Madeira", disse, considerando que "os processos de independência passam por três fases: ridicularização, hostilidade e aceitação. Neste momento, estamos entre a primeira e a segunda".
Relativamente à participação activa dos imigrantes na construção de uma futura "República da Catalunha", Carod Rovira afirma que "todos podem vir a colaborar numa nação que é permeável à contribuição exterior". Trata-se de um "projecto integrador", sublinha. "Quero ser independente e quero que Catalunha seja mais um Estado da União Europeia", salientou.
Referendo em 2014
O governante propõe um referendo para 2014 por três razões: a primeira porque em 2014 "assinalam-se os 300 anos sobre a data em que Catalunha perdeu a condição de Estado"; a segunda porque termina o investimento previsto pelo Estatuto de Autonomia da Catalunha, em matéria de infra-estruturas, por parte do executivo espanhol; e em terceiro lugar porque em 2014 acabam as ajudas do Fundo de Coesão Europeu. "O ano de 2014 não é a data para a soberania mas sim para a democracia", afirmou.
Instado sobre se o seu projecto político tem o apoio popular, Carod Rovira diz-se convencido que sim, porque "todos estamos conscientes que a Catalunha não pode esperar mais. O défice com Espanha é insustentável. No ano passado, arrecadámos 140 milhões de euros para instituições sociais e Madrid ficou com 127. Isto é incomportável". Inquirido se o seu projecto de independência pode vir a perder força, tendo em conta que vai deixar de ser presidente da Esquerda Republicana da Catalunha, Carod Rovira responde que há "milhares de pessoas que querem construir um Estado diferente de uma Espanha plural que não existe".
Sobre o futuro da União Europeia, Carod Rovira defende que "todos os europeus querem construir uma Europa mas todos eles a partir do seu Estado. Nunca a Europa esteve tão unida como actualmente, mas também é verdade que nunca houve na Europa tantos estados independentes". O dirigente assumiu que uma visita a Portugal é um "tema pendente porque, afirma, "Lisboa é uma das cidades que mais estimo".
No gabinete oficial, no Palau de la Generalitat, Carod Rovira tem uma fotografia com o ex-presidente da Câmara de Lisboa, João Soares, mas esta não é a única referência a Portugal já que utiliza o menu do telemóvel em português e um cartão de visita bilingue: em catalão e em português. No seu último livro "2014 - Que fale o povo catalão", cita uma passagem de um poema de Manuel Alegre: "Só quem espera verá o inesperado".
Saramago discorda da ideia
O escritor português José Saramago rejeitou hoje que Espanha não encare Portugal como um Estado independente. "Discordo completamente. Tenho com Espanha uma relação que é conhecida e nunca me apercebi de qualquer irregularidade política ou estratégia de qualquer tipo, comercial ou financeiro, que indicasse que Espanha não reconhece a independência de Portugal", disse o Nobel da Literatura.
A residir na ilha espanhola de Lanzarote há vários anos, José Saramago afirmou que "Espanha tem mais coisas em que pensar" do que em estar a "alimentar qualquer tipo de rancor histórico". "A pessoa que fez essas afirmações está a tentar defender os interesses da Catalunha, não acredito nada que esteja interessada em Portugal", sublinhou o escritor que visitou hoje em Lisboa a exposição "José Saramago. A Consistência dos Sonhos".
"Não há nada mais fácil do que afirmar, mas é necessário que se demonstre" o que se diz, disse o escritor, acrescentando que nesses casos "a imprensa fica com uma manchete e não tem mais nada para dizer do que isso. Não aparece a justificação de uma afirmação tão séria e grave como essa".
Compreendo Carod Rovira ao recordar que “se em 1640 as coisas fossem ao contrário, hoje Portugal seria uma região espanhola e a Catalunha um Estado independente”. Talvez sim, ou talvez não, vá-se lá saber as voltas que a História teria dado. Mas não me repugna aceitar que talvez não tivéssemos ganho a Batalha de Aljubarrota e recuperado a independência nacional naquela altura.
É um facto que Castela preferiu enviar o grosso do seu exército para jugular a rebelião catalã, em detrimento dos efectivos que mandou a Portugal para enfrentar – e sair derrotada – da “Crise de 1383/85”.
Mas, se isso são as tais ‘malhas que o império tece[u]’ não há dúvida que se mantém alguma desconfiança em relação aos apetites dos ‘nuestros hermanos’, bem patente no ditado popular que serve de título a este postal. E não só:
Após a adesão da Espanha à OTAN, e com a nossa participação comum na União Europeia, a única razão porque, no dispositivo da Aliança Atlântica, nós reforçamos o Norte de Itália e o Reino Unido nos reforça a nós, é que não aceitamos a presença de tropas espanholas em território luso. No Exército Português chamamos a isso o “síndrome de Aljubarrota”… embora saibamos que a invasão espanhola se faz hoje através do “El Corte Inglez” e não de forças armadas.
Por não ignorar que esta notícia serve a diplomacia da Catalunha e a sua reivindicação de independência, também compreendo que José Saramago desvalorize as declarações de Carod Rovira e considere que faltam provas de tão grave afirmação.
Contudo, foi Saramago quem declarou recentemente que era inevitável Portugal vir a integrar-se em Espanha. Portanto não me parece o português melhor colocado para desvalorizar a questão. Bem pelo contrário, com as posições pró-espanholas que tem publicamente tomado, assemelha-se mais aos tais que, Carod Rovira explica assim: "historicamente, sempre houve um certo complexo por parte de alguns sectores dirigentes em relação a Espanha", do que a outra coisa qualquer.
De qualquer forma, e polémicas aparte, não tenho dúvidas que se os vaticínios (ou desejos) de Saramago se concretizassem, lá teríamos Portugal transformado em mais um País Basco, uma Catalunha ou Galiza…
É bom não esquecer que a única região espanhola que não reivindica autonomia (ou independência) é: Castela a Velha. E essa não passa dos arredores do Palácio da Moncloa.
Álvaro Fernandes
2 comentários:
Carod.....¿Por qué no te callas?
Ó Sr Carod Rovira-polémicas aparte -como dizia o autor deste post, essa da "participação activa dos imigrantes na construção da futura República da Catalunha"... deixe-me rir! Todos colaboram enquanto são necessários, findo isso, pontapé no dito e vai para a tua terra. Isso acontece por exemplo na construção civil, ou estou enganada?
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