O ciclo político de José Sócrates
O ciclo político não corre de feição a José Sócrates. Corre mesmo cada vez pior. Como se não bastasse a crise económica e financeira, cujos efeitos aumentam de dia para dia ao ritmo das subidas de preço do gasóleo e ameaçam contaminar o ambiente eleitoral do decisivo ano de 2009, Sócrates vê-se agora constrangido pelas críticas públicas e puxões de orelhas de duas referências históricas do PS, dos dois candidatos socialistas às últimas eleições presidenciais. Mário Soares veio «sugerir ao PS – e aos seus responsáveis – uma reflexão profunda sobre as questões que hoje nos afligem mais: a pobreza; as desigualdades sociais; o descontentamento das classes médias». E não se coibiu de apontar a «insuficiência das políticas em curso para as combater». Manuel Alegre foi directo ao assunto: «Preocupa-me muito saber que o meu país tem as maiores desigualdades da Europa». E não se eximiu de responsabilizar os «socialistas de plástico» que por aí andam.
Sócrates reagiu da forma mais epidérmica e inconveniente a estes reparos críticos. Mostrou-se mais preocupado em dizer que o relatório sobre as desigualdades era de 2004, que Mário Soares fora «influenciado por um dos maiores embustes» (!...) de propaganda, do que em revelar sensibilidade social e reconhecer a dimensão do problema, hoje ainda mais actual e agravado pela influência corrosiva e empobrecedora da crise.
Mas Sócrates e o seu Governo perderam, nos últimos meses, o pé à situação política e o controlo dos acontecimentos. Em vez de anteciparem a crise e prepararem o país para os tempos difíceis que aí vinham, andaram a vender um optimismo insensato, a descer o IVA em 1% como sinal de retoma, a teimar num crescimento irrealista do PIB, que se viram obrigados a reduzir de um dia para o outro em mais de um terço. Agora, passaram duas semanas à deriva com os aumentos dos combustíveis sem Manuel Pinho saber o que fazer ou dizer. Mário Lino congela os passes sociais em Lisboa e Porto ignorando o resto do país. Jaime Silva responde à greve dos pescadores dizendo que o peixe não faltará nas lotas. É difícil fazer pior.
Com tanta arrogância política e autismo governativo, Sócrates ainda é surpreendido um dia destes com mais um artigo de Mário Soares. Não sobre ‘A má moeda e a boa moeda’, mas versando ‘A má esquerda e a boa esquerda’.
jal@sol.pt
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