terça-feira, 23 de junho de 2009

Costa Martins arrasa memórias de Vasco Lourenço...

O ex-ministro do Trabalho de Vasco Gonçalves classifica o livro de "ofensa ao 25 de Abril".
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Num extenso comentário enviado ao Expresso, o coronel Costa Martins disseca o livro "Do Interior da Revolução", uma longa entrevista de Vasco Lourenço a Maria Manuela Cruzeiro, do Centro de Documentação 25 de Abril e editado pela Âncora. Martins acusa Lourenço: "Em alguns casos, inventa factos; noutros - para fugir a responsabilidades, ou por ignorância - diz desconhecê-los; e em outros, manipula-os e subverte-os, chegando, por vezes, a fazê-lo de forma ridícula e até incorrendo em flagrantes contradições".Piloto-aviador na reforma, Costa Martins também esteve envolvido no golpe de 25 de Abril, após o que foi ministro do Trabalho de todos os governos de Vasco Gonçalves. Membro dos conselhos de Estado e da Revolução, participou em muitos dos episódios referidos no livro por Vasco Lourenço, mas pertencendo a uma corrente político-militar diferente: enquanto este foi um dos operacionais do "grupo dos nove", Martins fazia parte da corrente "gonçalvista", alinhada com o PCP. Se Lourenço foi um dos vencedores do 25 de Novembro, Martins passou à clandestinidade e chegou a viver em Angola."Vasco Lourenço tem o direito de não entender que o mundo ultrapassa os limites do seu umbigo", escreve Costa Martins. "O que não tem é o direito de ofender tudo e todos para dar largas ao seu exacerbado egocentrismo e à sua desmedida megalomania, parecendo usá-los como capa para mascarar as suas frustrações. Nem tem o direito de denegrir o bom-nome e a honra dos seus camaradas militares, com invencionices, deturpações e manipulações de factos, mentiras e calúnias, espezinhando tudo e todos, muitas vezes dissertando sobre o que não sabe, ou não conhece, e atraiçoando a própria História do país".Segue-se, na íntegra, o texto do coronel Costa Martins (os subtítulos são da responsabilidade do Expresso).
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Uma ofensa ao 25 de abril
* Costa Martins
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No Expresso de 25-04-2009, foi publicado um artigo de José Pedro Castanheira alusivo ao livro de Vasco Lourenço, intitulado "Do Interior da Revolução" em que sou visado. À partida, senti relutância em ler o livro pelo facto de Vasco Lourenço não me merecer confiança e por estar farto das suas mentiras e calúnias. Contudo, algumas pessoas recomendaram-me que o lesse, e acabei por fazê-lo. E valeu a pena.A entrevistadora, no contexto das perguntas e com os seus profundos conhecimentos, refere aspectos importantes da História recente de Portugal.Vasco Lourenço, dissertando sobre tudo e sobre todos, faz declarações por vezes inéditas.Em alguns casos inventa factos; noutros - para fugir a responsabilidades, ou por ignorância - diz desconhecê-los; e em outros, manipula-os e subverte-os, chegando, por vezes, a fazê-lo de forma ridícula e até incorrendo em flagrantes contradições.Vasco Lourenço chega a declarar que Melo Antunes era o único que tinha um plano estratégico para o país, mas que "foi um benefício" a sua saída da Comissão Coordenadora, quando ele entrou!E afirma a seguir que: "o mesmo se passando com a substituição de Costa Martins por Canto e Castro". Não se tratou de substituição na Comissão Coordenadora, mas sim da usurpação do meu lugar no Conselho da Revolução, "cozinhada" de forma porca e suja, que então denunciei e o Expresso publicou.
Não somos burros dispostos a comer toda a palha
Vasco Lourenço mostra a sua verdadeira personalidade, sobre a qual não posso pronunciar-me em termos clínicos porque não sou médico da especialidade; mas posso e devo fazê-lo em termos de apreciação comum, ainda que, por agora, de forma não muito aprofundada para não me alongar demasiado - apesar de haver "pano para mangas"...Vasco Lourenço tem o direito de não entender que o mundo ultrapassa os limites do seu umbigo.O que não tem é o direito de ofender tudo e todos para dar largas ao seu exacerbado egocentrismo e à sua desmedida megalomania, parecendo usá-los como capa para mascarar as suas frustrações.Nem tem o direito de denegrir o bom-nome e a honra dos seus camaradas militares, com invencionices, deturpações e manipulações de factos, mentiras e calunias, espezinhando tudo e todos, muitas vezes dissertando sobre o que não sabe, ou não conhece, e atraiçoando a própria História do País.Na voracidade dos enganos vai ao ponto de nem sequer poupar a criança, seu neto, na dedicatória que lhe fez! Toma-nos a todos como se fossemos uns burros dispostos a comer toda a palha que nos quer dar.Certamente usando o dom da ubiquidade, esteve em todas as reuniões do MFA. Dirigiu e comandou tudo e todos, admoestou generais e pô-los em sentido. Ameaçou atirar pela janela quem se lhe opusesse, e reclamou camisa-de-forças. Vetou decisões que não lhe interessavam - ainda que, por vezes, contrariando a vontade de todos os outros. Impôs o que entendeu. Opôs-se a que existissem Generais na Junta de Salvação. Entendeu que seria ele "o comandante do 25 de Abril". Achou que os órgãos de comunicação social "tinham de estar disciplinados". E propôs-se vetar o resultado das eleições democráticas se entendesse que os eleitos eram "reaccionários"!Com um tal democrata, para quê ditadores?
No 16 de Março
À medida que avançava na leitura do livro ia-se-me aguçando o interesse por tropeçar no capítulo em que Vasco Lourenço tivesse ordenado a Deus que se afastasse, para que fosse ele a comandar o mundo. Mas não o conseguiu.E tudo por causa dos seus camaradas militares, porque uns são "cobardes", outros "tontos", outros "pobres diabos", outros "actores de palco", outros, "um bluff". Enfim, "uma cambada de incompetentes".E os spinolistas? Essa "cambada de inúteis e imbecis" que "Spínola tinha à sua volta" e que só se apercebeu disso quando ele lhe chamou a atenção durante um reparo que lhe fez.Foi por tudo isso que, logo no dia 16 de Março - já nos Açores - "sem saber exactamente o que se estava a passar" chamou "montes de nomes à malta do Movimento. Estúpidos. Deitaram tudo a perder! "Não fora a contenção imposta pelo seu profundo sentimento de camaradagem - que sempre alardeou - e teria muito mais epítetos para qualificar toda essa cambada de incompetentes, de inúteis e imbecis, estúpidos, tontos, cobardes, pobres diabos, actores de palco, bluffs, que, em vez de o ajudarem só o atrapalharam!E foi por causa deles que não conseguiu afastar Deus e tomar o comando do mundo! Mas, também se o tivesse conseguido, não tinha tido a possibilidade de, no 25 de Abril, nos Açores, apelar ao Aspirante Ramos para que rezasse!Isto, à cautela, não fosse o diabo tecê-las, porque apesar de ter deixado tudo preparado e todas as ordens dadas a todos antes de embarcar para os Açores, o Otelo podia não as ter entendido e resolver usurpar-lhe o palco - que era seu, exclusivamente seu!
No 25 de Abril
Já os fascistas, também estúpidos e incompetentes, nem discorreram que, se em vez de o terem mandado para os Açores em princípios de Março o tivessem feito alguns dias antes, não tinha havido 25 de Abril!E a coisa que não lhes perdoa "foi o impedirem que estivesse aqui no 25 de Abril" - embora confesse que sempre esteve disposto a seguir!A fls. 187 do livro, a propósito da sua ida para os Açores, faz mesmo a seguinte declaração: "Está bem. Eu embarco. Já fizemos o que tínhamos a fazer, aliás, eu sempre estive disposto a seguir"!Se em vez de sempre ter estado disposto a seguir, tivesse tido a determinação de ficar e a coragem de enfrentar o regime recusando-se a embarcar, teria cá estado no 25 de Abril. Mas preferiu o pseudo rapto, para show off e como forma de fugir às responsabilidades, "empurrando-as" para cima de outros, em vez de as assumir.Até porque, pouco tempo antes, um Capitão do Estado-Maior da Força Aérea, a quem fora imposta uma deportação, recusou-se a embarcar e, mesmo sem ter atirado indivíduos pelas janelas nem reclamado camisa-de-forças, ficou cá e participou activamente no 25 de Abril! Contudo, melhor fora que esse "tonto" não tivesse cá ficado.Então não é que ele, "incapaz de perceber o seu Princípio de Peter", no 25 de Abril ia deitando tudo a perder com a emissão de um NOTAM determinando o encerramento do espaço aéreo português, o que fez com que Vasco Lourenço se visse impedido de regressar de imediato a Lisboa para estar "aqui no Continente, no centro dos acontecimentos" - no palco! Crime de "lesa-majestade" que nunca mais lhe perdoou.Contudo, se tivesse recusado seguir para os Açores, Vasco Lourenço, não teria sabido que, "afinal [tinha] uma importância doida" - apesar de não ter sido nessa altura que pediu uma camisa-de-forças - só se tendo apercebido disso quando, no seu embarque, se deparou no Aeroporto com os "pides, com aqueles carimbos todos da PIDE, gabardina, óculos escuros, ar sinistro"..."pides por todo o lado"..."tantos!"Mas não foi só em relação à ida para os Açores que, em matéria de fuga às responsabilidades em momentos sérios e difíceis, Vasco Lourenço esqueceu a sua tão exibida frontalidade e procurou fugir às responsabilidades.
No PREC
No Verão de 1975, a dada altura houve reuniões do CR, no Alfeite, em dias sucessivos. Numa dessas reuniões, para me atacar, fez acusações graves relativamente a dois processos que corriam no Ministério do Trabalho.Não podendo exibir elementos, por não os ter naquele momento, limitei-me a manifestar profunda estranheza.No dia seguinte levei os respectivos dossiers à reunião e provei ser mentira tudo quanto Vasco Lourenço propalara na véspera.Por não estar disposto a tolerar calunias, dirigi-me ao Primeiro-Ministro e ao Presidente da República, que participavam da reunião, e apresentei a minha demissão - que o Expresso noticiou. E sugeri a nomeação de Vasco Lourenço para me substituir como Ministro do Trabalho. Porque o cargo não era "pêra doce", encolheu-se e esquivou-se a aceitar tais responsabilidades.Na sequência de insistentes solicitações do PR e do PM para que eu permanecesse em funções, acabei por aceitar, mas deixei bem claro que não admitiria críticas levianas e assentes em falsidades, para mais vindas de quem mostrava incapacidade para desempenhar as funções e assumir as inerentes responsabilidades.Também, mais tarde, no dia 25 de Novembro, quando o confrontei com as vergonhosas calúnias que propalara na entrevista publicada no República em 20-11-75, relativas à Cabala do "Dia do Salário, mais uma vez mentindo procurou fugir às suas responsabilidades, declarando que não tinha dito "nada daquilo", que fora tudo invenções dos jornalistas e que iria fazer o desmentido no dia seguinte. Nunca cumpriu, nem nunca se retratou!No 25 de NovembroCom todo o seu heroísmo, no 25 de Novembro, em vez de ter assumido as suas responsabilidades, indo para o Comando da Região Militar de Lisboa, da qual era o comandante, "[deu] instruções a Ramalho Eanes para ir para a Amadora", e resolveu ficar em Belém" debaixo das asas do PR - não fosse, desta vez, o diabo tecê-las, para mais com a agravante de não ter à mão o Aspirante Ramos para rezar.Mas há cerca de um ano teve o descaramento de declarar que no dia 25 de Novembro nunca me viu em Belém, apesar de se ter encontrado comigo nas duas vezes em que lá fui reunir-me com o PR, precisamente a propósito do 25 de Novembro! No livro faz a seguinte surpreendente declaração: "Eu ainda hoje não percebi qual foi a actuação do Costa Martins". Assim sendo, tem falado à toa, de forma irresponsável e inconsciente, quando sobre ela se tem pronunciado; para mais, fazendo-o geralmente à base de mentiras e calúnias!Aliás, para que Vasco Lourenço pudesse "perceber qual foi a minha actuação" teria de saber primeiro, o que verdadeiramente, esteve por trás do 25 de Novembro, por trás da sua azáfama, do "levar e trazer", do "diz que disse" e das tarefas sujas a que se prestou, mentindo e caluniando camaradas que, de boa fé, o consideravam amigo.É óbvio que eu - tal como a esmagadora maioria da população - não estava de acordo com os crescentes desmandos com que, no dia a dia, éramos confrontados, nem com o desnorte existente no País. Mas sabia que o que estava em causa não era o apregoado. E sempre estive contra a destruição dos Valores e Princípios Éticos, imprescindíveis ao relacionamento dos cidadãos na "prometida sociedade de rosto humano."
O exibicionismo da megalomania
Vasco Lourenço, na ânsia da sua desmedida ambição, parece ter corrido atrás de miragens acenadas por "aladinos" - qual coelho correndo atrás das cenouras - mas que, a final, em matéria de concretização se confinaram a duas efémeras estrelas, rapidamente apagadas quando os seus "brilhantes serviços" deixaram de "ter aproveitamento".E de pouco lhe serviu ter ido sentar-se na cadeira do Primeiro-Ministro, em São Bento, num dia em que o Governo reuniu em Belém.Parece serem essas as causas das suas incontidas frustrações bem espelhadas no livro, ainda que aparentemente camufladas pelo exibicionismo da sua megalomania e pela linguagem deselegante, grosseira e por vezes ofensiva, com que se refere a camaradas e se dirige publicamente a entidades respeitáveis, inclusivamente ao próprio Presidente da República, pensando que, assim, parece importante!
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.*Costa Martins Coronel piloto aviador, na reforma; ex-ministro do Trabalho dos II, III, IV e V Governos Provisórios; ex-membro da Comissão Coordenadora do MFA, do Conselho de Estado, do Conselho da Revolução e do Conselho dos Vinte.

1 comentário:

Anónimo disse...

A Vasco Lourenço não devo nada, inclusivé a nossa liberdade. Com Costa Martins, Ministro do Trabalho do II, III, IV e V Governos Provisórios do também saudoso Vasco Gonçalves (Primeiro Ministro), ficaram a dever a grande maioria dos trabalhadores, o Salário Mínimo Nacional, um mês de férias + o correspondente subsídio e ainda o subsídio de Natal. Até ao 24 de Abril, os direitos dos trabalhadores portugueses era ZERO!!! salvo os previligiados da «outra senhora». Assim fossem sérios aqueles que têm des(governado) o meu País nos últimos 33 anos, ou sejam PS+PSD+CDS. Disse. Cravo de Abril!