sábado, 27 de junho de 2009

Em plano inclinado...

A trapalhada (a coisa não tem outro nome) em que o Governo se meteu por causa da intenção da PT de adquirir 30% da Media Capital (dona da TVI) teve ontem o seu mais patético episódio: o primeiro-ministro vetou a operação, por não querer que, como os maldosos vinham dizendo, se pensasse remotamente na possibilidade de o Executivo estar a manobrar no sentido de alterar a linha editorial da estação televisiva, que lhe é agreste.
Isto é: José Sócrates travou, pela força de uma anacrónica "golden share", um negócio entre empresas privadas apenas e só porque isso lhe convém politicamente. Extraordinário.
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Diz o adágio: o que começa mal, tarde ou nunca se endireita. O "caso PT/TVI" mostra bem a veracidade do provérbio popular. De forma espantosa, Sócrates meteu-se num beco sem saída, ao dizer que nada sabia sobre o negócio. Se não sabia, devia saber. Se não sabia, devia pedir explicações aos responsáveis máximos da empresa.
Como não o fez, deixou que uma carregada nuvem de suspeições se abatesse sobre o caso. A estocada final pertenceu ao presidente da República, quando, usando exactamente a mesma expressão escolhida por Manuela Ferreira Leite, pediu "transparência" às partes.
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O que impressiona mais nisto tudo é a circunstância de o Governo vir a somar erro atrás de erro sem que ninguém, incluindo Sócrates, ponha travão à desgraça. Ele foi o despistado ministro da Agricultura a desmentir-se em meia-hora; ele foi a estranha história da Fundação para as Comunicações (que ainda há-de dar muito que falar); ele foi o recuo no TGV....
De repente, o Governo parece ter entrado na fase do plano inclinado, etapa da qual é muito delicado sair, sobretudo quando ela surge logo após uma fragorosa derrota eleitoral.
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Há um mês ninguém no seu perfeito juízo diria que tanta asneira junta seria possível num Governo que se especializou no controlo de danos e na eficácia da mensagem a passar. Mas, enfim, a vida tem destas coisas.
E, num instante, parece que estamos de volta ao desastroso Governo de Santana Lopes: tudo parece inconsistente, volátil, efémero e decidido em cima do joelho, em função das circunstância e não da importância.
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Quem beneficia com isto? Antes de mais, o PSD, claro está. A Manuela Ferreira Leite basta-lhe agora ficar quietinha no seu sítio a bater com violência na tecla do endividamento e das obras públicas que nos hipotecam o futuro. Por este caminho, o Governo tratará de cavar ainda mais o fosso com o eleitorado que mostrou o seu desagrado nas eleições europeias. Quem diria? Sócrates encontra-se num labirinto.
E a cada dia que passa é-lhe mais difícil encontrar a saída.
Paulo Ferreira
in JN

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