Não há como uma derrota eleitoral para que os políticos desçam à terra. A aterragem forçada tem efeitos psicológicos devastadores, estando na origem de comportamentos políticos imprevisíveis e, por isso mesmo, surpreendentes.
Quando perdeu as autárquicas de 2001, António Guterres teve uma revelação. Descobriu o pântano, arrumou as malas e foi para casa. Dois anos depois aconteceu a mesma desgraça a Durão Barroso, nas eleições europeias. Com a rapidez que o caracteriza, entendeu os sinais e zarpou para Bruxelas.
O choque com a realidade, ou seja, com a derrota nas urnas, teve um efeito diferente em José Sócrates. Ganhou asas. De animal feroz transformou-se, por artes mágicas, num anjo político. Feroz, mas anjo. Arrependido, humilde, compreensivo. Não há dúvida que a democracia faz milagres. Esta extraordinária mudança levanta uma dúvida: como é que um político pode ser em quatro meses o que não foi em quatro anos? E qual é o verdadeiro? O determinado da primeira fase, ou o arrependido da segunda? Será que entre os dois personagens só há de comum o nome? Os portugueses vão andar baralhados nos próximos tempos.
Esta súbita mudança tem consequências práticas. Já sabíamos que o país estará em campanha eleitoral nos próximos quatro meses. Ficámos agora a saber que, além de parado, o país poderá assistir à revisão de muitas das políticas do actual Governo. Ou seja, entrámos no eleitoralismo puro e simples.
O primeiro sinal foi o adiamento do TGV. Medida acertada. Mas que é tomada, não por convicção mas por táctica. Outra foi o anúncio da morte da avaliação dos professores. Não por arrependimento genuíno, mas porque o PS perdeu o voto dos professores. E é só o princípio. Quatro anos de governação serão atirados para o lixo em quatro meses, em tudo o que for impopular. Alguns ministros desaparecerão do mapa, na impossibilidade de fazer uma remodelação. O Governo será José Sócrates. Até Outubro vai ser uma farra. Depois, ai de quem vier. O país chegará lá exaurido, mais pobre, endividado e sem estratégia. Os sinais são alarmantes, qualquer que seja o indicador que se analise.
O problema dos políticos quando estão no poder é só descobrirem a realidade tarde de mais. Foi assim com Guterres, com Barroso e agora com Sócrates. O problema é que eles vão e o país fica. E fica com os problemas de sempre por resolver.
Luís Marques
in Expresso
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