quinta-feira, 10 de julho de 2008

Jornalismo e poder



Uma técnica que vem de longe

Sem prejuízo de, em breve, aqui se dar uma visão desta técnica tal como é utilizada hoje pela comunicação social, eis um exemplo de como o discurso – neste caso, os títulos – de um jornal da época vai acompanhando, dia a dia, a evolução da relação de forças na política francesa.
Primeiro, os factos. Em 1815, no curto período de 12 dias, Napoleão Bonaparte, então forçado ao exílio na ilha de Elba, evade-se, regressa a França, reagrupa as forças que lhe são fiéis e avança rapidamente para Paris. Aí, nas Tulherias, retomará o poder para o que ficou conhecido como os “Cem Dias” (após os quais seria de novo destituído e desterrado para a ilha de Santa Helena, onde acabaria por morrer).

Eis, agora, como o mais importante jornal parisiense da altura, o Moniteur Universel, que tivera ao longo da sua história diversas disputas com congéneres seus pela posição de “único jornal oficial”, vai descrevendo o que se passou nesses 12 dias:

- dia 9 de Março de 1815 – “O monstro fugiu do seu desterro”.
- dia 10 – “O ogro corso desembarcou em Cape Jean”.
- dia 11 – “O tigre apareceu Gap. Os exércitos dirigem-se para ali, para travar o seu avanço. A miserável aventura terminará como as dos delinquentes, nas montanhas”.
- dia 12 – “O monstro chegou à cidade de Grenoble”.
- dia 13 – “O tirano está agora na zona de Grenoble e Lyon. Toda a gente está aterrorizada desde que ele apareceu”.
- dia 18 – “O usurpador ousou aproximar-se de um ponto situado a 60 horas da capital”.
- dia 19 – “Bonaparte aproxima-se a passo veloz, mas é-lhe impossível entrar em Paris”.
- dia 20 – “Napoleão chegará amanhã às muralhas de Paris”.
- dia 21 – “O imperador Napoleão está em Fontainebleau”.
- dia 22 – “Ontem pela tarde, sua Majestade o Imperador fez a sua entrada pública nas Tulherias. Nada pode superar este regozijo”.

Rui Pereira in “Mudar de Vida”

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