terça-feira, 11 de março de 2008

NÃO TE CUIDES, NÃO, SÓCRATES


Fernanda Tadeu ao centro
foto de fotografiasempre.blogspot.com

Enquanto o país desce à rua numa imparável onda de contestação cívica ao Socratismo, a televisão pública entretém-se a debater os méritos da realeza e a possibilidade de restauração da monarquia.

Se não acreditam é porque não assistiram ao programa “Prós e Contras” transmitido ontem pela RTP1. Mas saibam que a inefável Fátima Campos Ferreira não encontrou tema mais actual e importante para preencher três longas horas de emissão do que dedicá-las a esse candente desígnio nacional. Ficámos a saber que o rei corporiza o afecto pela Pátria e a sua legitimidade reside na família de que descende para representar, na chefia do Estado, toda a comunidade nacional; e que isso, obviamente nunca está ao alcance de um mero presidente da República. E mais: também nos foi dito que aí reside a essência da democracia e da liberdade tão mal tratada pelo regime republicano que até pode ser ditatorial. É claro que as monarquias feudais do Golfo ou da Ásia, para já não falar da Itália do rei Humberto e Mussolini não são nem foram ditaduras. Aliás, como o reinado de D. Carlos com o governo de João Franco mais não foi do que o esplendor da monarquia constitucional.

Não resisto a propósito de transcrever parte de um artigo do historiador António Louçã, publicado na revista “Pessoas”, nº 28 Genebra:

“Na vozearia de corifeus que se orquestrou por ocasião do centenário, não faltaram os admiradores do génio científico e do talento artístico que o rei, como Nero, atribuía a si próprio e cortesãos pressurosos lhe confirmavam sem pudor. Marcelo Rebelo de Sousa tentou cavalgar esta onda de monarquismo serôdio, dando como é seu hábito uma no cravo e outra na ferradura. A mais notável, foi a afirmação de que Carlos I era um rei constitucional e “apenas” reinou em ditadura durante uma pequena parte do seu reinado.

Ora, as ditaduras começam de pequeninas, crescem, desenvolvem-se e podem durar 48 anos ou mais. Se o tirano é abatido pouco depois de tomar o poder, cortou-se o mal pela raíz. A ditadura ainda agora começou e o ditador já ali jaz, varado pelas balas da Carbonária? Tanto melhor. O homem que foi abatido, no momento de ser abatido, não era um rei constitucional e sim o fundador duma ditadura.

Em 1 de Fevereiro de 1908, os pergaminhos constitucionais da sua linhagem já faziam parte do passado. Ao entregar o poder a João Franco, por cima do parlamento e dos partidos, Carlos I tinha reatado com a tradição da Vilafrancada, quando Carlota Joaquina era o único homem da corte e se dispunha a afogar em sangue as veleidades democráticas do povo. Esse reatamento explica o entusiasmo pelo “constitucional” Carlos I por parte dos actuais rebentos da mais caceteira linhagem miguelista, com Duarte Pio à cabeça. Não foi que eles mudassem: a monarquia portuguesa, que fugiu para o Brasil, quis-se absolutista no regresso e, depois dum breve interregno comprado à custa da guerra civil, voltou ao redil do absolutismo e nesse redil teve de morrer, como mandava a sua natureza mais profunda.

Diz tudo sobre a podridão do regime que temos, o facto de a onda anti-republicana encontrar ecos simpatizantes e compreensivos no próprio presidente da República, que veio a terreiro prestar pública homenagem a Carlos I e condenar o regicídio. Diz tudo sobre essa podridão, que a direita intime o parlamento republicano a professar o seu repúdio pela morte do aprendiz de tirano e não caia em cima da intimação um vendaval de gargalhadas. Diz tudo, que monárquicos ressabiados já tenham o desplante de recusar guarida no Panteão Nacional ao grande Aquilino Ribeiro, por ter participado na conspiração regicida (Aquilino teria agradecido: os reaccionários e fascistas que continuassem a ficar uns com os outros no Panteão).”

Não sei se José Sócrates leu este artigo ou viu o programa televisivo a que me refiro. Mas certamente sabe que Fernanda Tadeu, mulher do ex-ministro, actual presidente da Câmara de Lisboa e número dois do PS, António Costa, juntou a sua voz ao clamor de repúdio que desceu a Avenida e inundou o Terreiro do Paço.

Se José Sócrates não se cuida, Costa chega antes de Menezes a primeiro-ministro.


1 comentário:

Anónimo disse...

Qual é a surpresa de Fernanda Tadeu participar em manifs? Então A mãe de António Costa, Maria Antónia Palla não tem feito o mesmo?
E não foi ela que já se referiu a Sócrates como tendo "a cabeça altamente misógina"?
Sócrates que se fie nas divisões do PSD e logo vê. Faz-me lembrar quem "só vê o argueiro no olho alheio e não vê a tranca no seu".