quarta-feira, 25 de junho de 2008

Textos de Filosofia Política (9)


MARX E A TECNOCRACIA

Marx, viu nos valores do proletariado os inputs da bomba nuclear que a história vinha fabricando contra a civilização controlada pelo capital.
Os valores burgueses são soberanos nas economias de mercado. Produto da hegemonia dos interesses dos detentores dos meios de produção e emblemáticas da sua cultura, as ideias dominantes são, em Marx, definidoras das atitudes e comportamentos aceitáveis. Para lá delas estende-se o mundo da marginalidade e da subversão.
No discurso marxista, o pacote de valores elaborado pela classe burguesa é instrumento decisivo do seu domínio, dado que a reprodução do sistema capitalista exige a interiorização de representações do mundo concordantes com os princípios que justificam e ocultam a exploração da força de trabalho juridicamente livre.
Porque as ideias dominantes servem para perpetuar o poder dos detentores do capital, podem ser encaradas como as “ideias do seu domínio”. Na verdade, a moral industrial decretada pelos interesses da burguesia delimita a área dos comportamentos permitidos e injecta-os com os valores funcionalmente compatíveis com o sistema.
Na sociedade capitalista, Marx apreende a clara dissociação entre o ser e o fazer. A lógica do capital faz da força de trabalho uma mercadoria e coloca-a ao serviço da acumulação privada.
O uso das capacidades físicas e intelectuais do trabalhador é equacionado em função do lucro, desvirtuando-se os fins que o trabalho deve e pode preencher no futuro: realizar o homem, devolvendo-o a si próprio. Ao invés disso, o trabalho nas economias burguesas degrada: desrealiza o homem, separando-o de si próprio.
Uma vez que o trabalho serve desígnios privados, as condições organizacionais em que o homem opera as suas capacidades, transformando a sua “força de trabalho” em “trabalho”, são alienantes:

1) A especialização extrema conduz o trabalhador á unidimensionalidade.

2) A subordinação do trabalho ao capital amputa o trabalhador da liberdade criativa.

3) A produção desumaniza o trabalho porque serve necessidades artificialmente criadas em tributo do lucro.

4) A reprodução ampliada do capital supõe a exploração da força de trabalho que, por ser uma mercadoria especial, tem o atributo único de produzir um valor excedentário, do que é necessário para assegurar a sua reprodução. A noção de mais-valia exprime o valor que o capital subtrai ao trabalho e o salário encarna o valor que o trabalho recebe para garantia da sua existência

5) No processo de criação de mais-valia, o trabalhador é material e espiritualmente violentado, porque uma parte significativa do seu esforço integral e das suas qualidades totais - físicas, afectivas e intelectuais - materializadas no produto do seu trabalho, é apropriada pelo capitalista, na qualidade de titular dos meios de produção.

São estas características dos ambientes organizacionais e atributos do trabalho em sistema capitalista que põem o ser e o fazer em antítese. Com efeito, a necessidade de vender a força de trabalho redunda na alienação do ser em benefício de um fazer que tende a adulterar o homem, violentando-o física e espiritualmente no presente e comprometendo as suas possibilidades de realização no curso do tempo.
A pessoa que o trabalhador é, não só se não cumpre no exercício do trabalho como se sujeita a um processo de degradação que pode comprometer a sua emancipação no futuro.
O modo de produção capitalista é dinamizado por cadeias de interacções nucleares entre os proprietários dos meios de produção e os donos da força de trabalho, intensamente favoráveis aos primeiros.
As interacções que preenchem o núcleo social do sistema produtivo capitalista são complexos jogos de poder onde a supremacia do capitalista sobre o proletário se afirma de forma vital. São relações de produção que marcam o domínio directo do capital sobre o trabalho e promovem o poder burguês sobre a sociedade inteira.
Assim, em Marx, o ser que a história inapelável tem vindo a esboçar desde o alvorecer dos tempos e que realizará no comunismo, é perturbado, pervertido e adiado, porque a natureza e os fins do fazer em sistema capitalista são autoritariamente decididos pelos detentores do capital em função de interesses pessoais necessariamente redutores.
A existência, que segue um curso inscrito na natureza das coisas, vive de um tempo mutilado em que os homens se perdem de si, alienando-se. Este é um tempo pré-histórico porque nele os homens não são livres de decidir sobre os seus destinos. Este tempo que começa nas sociedades arcaicas é, depois, sociologicamente marcado pelas sociedades de classes.( CONTINUA)
Valter Guerreiro

1 comentário:

zigoto disse...

Ora aqui está uma análise que, contra ventos e marés, explica a actualidade de Marx.
Leiam também os textos anteriores de Valter Guerreiro, e os que virão a seguir, que perceberão melhor o que se passa no mundo.
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