terça-feira, 21 de abril de 2009

Cultura, Não

Já que as gentes de Santa Comba, em atitude provocatória, querem relembrar a 25 de Abril, a memória da figura mais sinistra da nossa história, trago aqui dois episódios, passados com os meus dois avós em que ele esteve presente. Num duma forma autêntica, na outra através dos seus paus-mandados.
Meu Avô João, oficial de engenharia, em 1926 adoece com a doença da época, a tuberculose, e passa 10 anos entre os sanatórios da Guarda e do Caramulo. Homem de cultura, inteligente e democrata, durante aqueles anos escreveu, sob os pseudónimos de "João das Benquerenças" e de "João da Beira" para vários jornais. Lembro a "Era Nova", "O Diabo" e outros em que, como não podia deixar de ser, era um crítico do que se passava.
Em 1936 é dado como "clinicamente curado"! Foi curta essa cura. Apresenta-se na Direcção da sua Arma e houve a voz, ao fundo, do Brigadeiro Director: "É F...., aquele que escreve para os jornais? Ele que venha cá, de hoje a oito dias, para uma Junta Médica".
Ele foi. E foi compulsivamente reformado. Seis meses depois morria. Minha Mãe tinha 16 anos. Meu Tio, mais velho, deixou de estudar e foi trabalhar. Para sustentar a família.

Meu Avô Luis, cantor lírico, nos anos 30 é recebido por Salazar. Iam com ele o Maestro Pedro de Freitas Branco e o tenor Alves da Silva. Iam pedir uma ajuda para a Companhia Portuguesa de Ópera que tinham criado. Não havia em Portugal uma Companhia de Ópera!
Ouvi-os e, no fim, com aquele sorriso cínico, que é tão comum em certo tipo de pessoas, despediu-os assim: "Meus caros, eu não tenho para os que choram, quanto mais para os que cantam".

E é uma figura destas que destruiu famílias, amordaçou e castrou um povo inteiro que há, ainda, quem queira lembrar. Não.

1 comentário:

zigoto disse...

Caro João

o regozijo de O Cacimbo por o termos já entre os autores do nosso corpo redactorial, será uma agradável surpresa para os nossos leitores.

A pertinência, oportunidade e acutilância deste seu primeiro post, garante que o seu contributo vem enriquecer o nosso trabalho colectivo.
Bem-haja por ter aceite o meu convite que, como administrador do nosso blogue, me competia fazer-lhe.