Ainda que de forma envergonhada, começam a aparecer por aí os primeiros arautos da confiança no futuro próximo.
Dizem eles que a crise económica já bateu no ponto mais baixo. Dizem eles que se vislubram no horizonte os primeiros sinais de que o pior já passou. Dizem eles que não tarda nada e já podemos suspirar de alívio. Finalmente.
Verdade que nenhum dos optimistas se atreveu a decretar, como fez um dia o ministro Manuel Pinho, o fim da crise. Mas que o perigo do regresso do facilitismo anda à solta, lá isso anda. A coisa, claro, tenderá a piorar, com a série de três eleições que temos à porta.
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E, no entanto, os números (essa terrível arma que tantas vezes atropela os desejos das boas almas) mantêm-se teimosamente maus. Seguem-se dois curtos exemplos.
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O Produto Interno Bruto (PIB - indicador que traduz a riqueza produzida) dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, que junta os trinta países mais industralizados) caiu 2,1 por cento no primeiro trimestre de 2009 face ao anterior, registando a maior queda desde a criação deste indicador em 1960, indicou ontem aquela prestigiada organização.
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O que significa isto? Que nos países mais ricos ainda não se vislumbra nenhuma retoma. E se nos países mais ricos não há sinais de entusiasmo, o que pode pensar-se dos países mais pobres, como o nosso? Que a retoma ainda é uma miragem. E é, de facto. Na Zona Euro, por exemplo, a queda do PIB foi superior à média (2,5 por cento, após ter cedido 1,6 por cento nos três últimos meses do ano passado).
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Consequências? Estão à vista. Manchete da edição de ontem do JN: a crise está a obrigar 326 mil pessoas a recorrer a um segundo trabalho para poderem sobreviver, esticando as remunerações até ao limite dos limites, em condições dignas.
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De acordo com o insuspeito Instituto Nacional de Estatística, um terço dos empregados (cerca de um milhão e meio de pessoas) leva para casa, ao final do mês, pouco mais do que 600 euros. Outro milhão de pessoas ganha até 900 euros mensais. Há mais pessoas a auferir menos do que 310 euros do que a ganhar entre 1800 e 2500 euros. E ainda há umas dezenas de milhares a trabalhar a troco de um salário pago em espécie.
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Se pensarmos que todas estas pessoas - ou, pelo menos, a maioria delas - tem filhos para sustentar, chegaremos depressa a um cenário que contraria e torna absolutamente inverosímil qualquer espécie de sorriso mínimo perante o que o futuro próximo nos reserva.
Desconfiemos, portanto, das vozes que propalam tal cenário. Desconfiemos...
Paulo Ferreira
in JN
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